quarta-feira, 31 de maio de 2006

Escola Indígena

por Analice Bolzan

Eles eram muitos. Na época do Descobrimento, mais de dois milhões. Hoje, restam 360 mil índios no país, de 219 etnias, segundo o Censo Indígena de 2001. Mas as perdas não são só numéricas. São territoriais e, principalmente, culturais. O índio de hoje que resiste ao contato com o homem branco, isolado no interior do Brasil, ainda consegue manter ilesos seus costumes. Mas aquele que vive perto das grandes cidades, na beira das estradas e até nas reservas, usa roupa de homem branco e troca a oca pela casa de lona ou alvenaria. A falta da caça e da pesca deu lugar à miséria. Mas os costumes ainda resistem. Em uma reserva gaúcha, o concreto não inibiu a família de fazer o fogo como os antepassados; mesmo que, agora, seja na varanda. O português enrolado convive com o guarani.

Hoje, no Brasil, das mais de 1.100 línguas faladas por eles no final do século XV, restaram apenas 180. Mas a Constituição Federal de 1988 reconheceu o direito dos índios e a obrigação da União de manter seus costumes, línguas, crenças e tradições.

No Rio Grande do Sul, na Reserva Indígena do Cantagalo, em Viamão – cidade que faz divisa com Porto Alegre – a escola funciona em um galpão que também serve de centro comunitário. Lá, quinze crianças são alfabetizadas em português e guarani. Eles fazem parte dos mais de 93 mil índios matriculados nas escolas do país.

O Censo Indígena aponta que escolas improvisadas como esta não são poucas. São quase todas rurais, extensões de escolas urbanas, com calendários e currículos próprios. Geralmente, a professora de português veio de uma escola estadual. A de guarani, da própria tribo, com um perfil típico dos quase 4 mil professores indígenas do país : muita vivência e pouca formação.

Até agora, dos alunos da única turma da reserva, só cinco falam português, ainda que com dificuldade. A aprendizagem deve ser feita no ritmo deles, através da realidade de cada lugar. Arlindo Benitez da Silva quer ensinar o que sabe. Nasceu na reserva, estudou nela até a quarta série e na cidade completou os ensinos médio e fundamental. Agora se prepara para ser professor. Aos 22 anos, também aprendeu que falar português pode ser uma forma de autonomia para circular no mundo dos brancos.

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